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A Primeira Sinfonia

Em 1808, um jovem de onze anos foi admitido como aluno no Internato Stadkonvikt, uma escola de jesuítas onde se ensinava música aos integrantes do coro da Capela Imperial de Viena. No dia em que se despediu, cinco anos mais tarde, a orquestra da instituição tocou em contexto privado uma obra da sua própria autoria. Era a primeira sinfonia de Franz Schubert.

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No princípio do século XIX, qualquer músico que tivesse a pretensão de se afirmar enquanto compositor sabia bem da necessidade de dedicar-se sem reservas a um de dois géneros: ou a ópera ou a sinfonia. Schubert tornou-se conhecido graças às suas extraordinárias canções acompanhadas ao piano e pela música de câmara que compôs ao longo de toda a vida. Esse reconhecimento limitava-se, no entanto, ao círculo restrito de alguns salões de Viena. Para seu infortúnio, e apesar de todo o empenho, nunca conseguiu obter sucesso em qualquer daqueles outros domínios. Tal não impede, porém, que tenha assinado algumas das páginas sinfónicas que se juntaram postumamente àquelas mais apreciadas entre todo o repertório oitocentista.

Tentara compor uma sinfonia em 1811, mas só conseguiu fazê-lo por completo dois anos mais tarde. Tinha então dezasseis anos de idade. Na meia década seguinte completou outras cinco, todas elas moldadas nos estilos das principais referências da época: Haydn, Mozart, Beethoven e Rossini. Tomando esta primeira sinfonia como exemplo, é-nos possível reconhecer traços melódicos e encadeamentos harmónicos explicitamente emprestados daqueles compositores. Tem início com um Adagio solene, à semelhança do que se assiste em tantas sinfonias de Haydn. Segue-se então a forma clássica tripartida, com Exposição, Desenvolvimento e Reexposição. Desde logo, é tentador rastrear a influência de Beethoven. O segundo tema dos primeiro e último andamentos resultam de variações sobre um desenho melódico que o músico de Bona usou em várias obras suas, designadamente no bailado As Criaturas de Prometeu e no último andamento da Sinfonia Eroica. Para lá dessas «ressonâncias», o ouvinte poderá ainda identificar no andamento lento algumas semelhanças com a Sinfonia Praga de Mozart e, já no Minueto, a projeção do formato instituído por Haydn em que um Trio central reporta ao género Ländler, uma dança de pulsação lenta tradicional daquela região. A influência das últimas sinfonias de Mozart está também presente no derradeiro andamento. Por momentos, é possível reconhecer alguns recursos que lembram as sonoridades cristalinas da célebre Sinfonia N.º 40.

 

Rui Campos Leitão