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Projeto MUSICAR


Apresentação


O projeto MUSICAR foi concebido e implementado pela Metropolitana – Associação Música, Educação e Cultura, instituição sem fins lucrativos sediada em Lisboa (Portugal) com a missão de divulgar a música de tradição clássica por intermédio de concertos públicos, do ensino da música e de atividades socioculturais.

A Metropolitana é entidade gestora de duas orquestras – a Orquestra Metropolitana de Lisboa e a Orquestra Académica Metropolitana – e de três estabelecimentos de ensino – a Academia Nacional Superior de Orquestra (ensino superior), a Escola Profissional Metropolitana (ensino integrado) e o Conservatório de Música da Metropolitana (nível básico e secundário).

Com apoio do MusicAIRE, ação cofinanciada pela União Europeia para apoio à indústria da música, a iniciativa decorreu entre fevereiro e novembro de 2023 com o objetivo de identificar e ensaiar práticas de ensino e aprendizagem da prática musical individual e de conjunto especificamente orientadas para alunos cegos ou com baixa visão e alunos surdos.

O projeto estruturou-se em diferentes fases:

Começou por chamar até si agentes da sociedade civil com vocações afins para participarem na realização de laboratórios temáticos. De seguida, envolveu todos os colaboradores da Metropolitana e profissionais de outras escolas em 12 ações de formação com temáticas diversas destinadas a professores, músicos, auxiliares de educação, corpos administrativos, técnicos de produção, comunicação e relações-públicas. Para o efeito, foram convidados, na qualidade de formadores, profissionais com experiência adquirida nas respetivas áreas. Proporcionaram-se assim momentos de encontro, partilha de ideias e conhecimentos que orientaram os passos seguintes. Destacaram-se os contributos das parcerias estabelecidas com os projetos Filarmónica Enarmonia (Bengala Mágica) e Mãos que Cantam.

Chegados à fase mais prática da implementação do projeto, realizaram-se 4 ateliês exploratórios seguidos de 10 semanas com aulas regulares de instrumento individuais e aulas de conjunto conducentes à apresentação de um concerto público realizado no dia 29 de novembro no Teatro São Luiz, em Lisboa, com obras de Beethoven, Mozart, Verdi e Lino Guerreiro.

Este Concerto Final contou com a participação da Orquestra Metropolitana de Lisboa e do seu diretor artístico Pedro Neves, do coro Mãos que Cantam e do seu maestro Sérgio Peixoto, do maestro cego Adrian Rincón, do pianista cego Jorge Gonçalves e de todos os alunos MUSICAR, designadamente o Coro Participativo MUSICAR formado por 32 pessoas cegas e normovisuais, e um ensemble de bombos formado por 50 alunos surdos das Escolas Básicas Parque Silva Porto e Quinta de Marrocos e do Curso de Formação e Qualificação de Adultos do CED Jacob Rodrigues Pereira da Casa Pia de Lisboa.

Assistiram a este espetáculo 528 pessoas, tendo o teatro lotado em virtude de parte dos lugares ter sido ocupada pelas dezenas de participantes surdos do projeto que intervieram tocando bombo na última peça do programa, designadamente a estreia absoluta de uma obra expressamente encomendada ao compositor Lino Guerreiro para esta ocasião.

As diferentes ações do projeto MUSICAR foram registadas em som e imagem para produção e publicação de teasers de divulgação e para a edição próxima de um vídeo-documentário. Foi ainda constituído um Núcleo de Ensino Especializado no seio do corpo docente das escolas da Metropolitana para ponderação de uma futura implementação destas especialidades de ensino no Conservatório de Música da Metropolitana.



Contexto e Objetivos Gerais

A oferta em matéria de ensino da música especificamente orientado para pessoas cegas ou com baixa visão e pessoas surdas é extremamente deficitária na generalidade do território da União Europeia, muito particularmente em Portugal. O ensino formal da música, na modalidade combinada da teoria com a prática, não está disponível para alunos cuja condição comporta um estigma que, em si mesmo, remete para a liminar exclusão ou para uma aprendizagem tendencialmente autodidata.

Muitos estudos comprovam que, independentemente da idade, as vantagens da aprendizagem da música para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e motor são muito benéficas para todos aqueles que têm esse privilégio. Trata-se, portanto, de um direito de cidadania que se impõe debater no contexto do combate às desigualdades e à discriminação das diferenças, também no que respeita ao acesso à cultura e às artes.

Com este projeto, a equipa da Metropolitana propôs-se discutir e ensaiar soluções aplicadas ao ensino-aprendizagem da teoria da música e da prática vocal ou instrumental para estes alunos. Quis-se perceber o interesse e a adesão da própria comunidade relativamente a esta área de formação e identificar os recursos logísticos e humanos necessários para garantir um ensino regular e de qualidade. Nesse sentido, foram beneficiários deste projeto aqueles que se propuseram explorar e aprender, assim como todos os que de algum modo contribuíram para a sua implementação; alunos, familiares, professores, a generalidade dos recursos humanos da Metropolitana, docentes e funcionários das três escolas de acolhimento, a equipa do teatro São Luiz, jornalistas, o público que assistiu ao concerto e toda a comunidade que contactou com o projeto através dos meios públicos de comunicação.

As aulas regulares – individuais e de conjunto –, apesar de terem decorrido durante um período relativamente curto, apenas 10 semanas, visaram proporcionar uma experiência concludente e a oportunidade de avaliação das competências intrínsecas do próprio processo de ensino e de aprendizagem, tais como o empenho, o compromisso, o trabalho em equipa, o reforço do auto-sujeito, da concentração, da frustração e da superação das dificuldades. A capacitação de professores de música para o ensino a cegos e surdos foi outro dos objetivos, de maneira a criar familiaridade com a diferença e a favorecer a aquisição dos conhecimentos fundamentais para ensinar estes alunos no futuro, seja na Metropolitana ou em quaisquer outros conservatórios.

O convívio entre iguais e o contacto com o público pretenderam dar azo a uma confraternidade que favorecesse a aceitação social de indivíduos afetados pela cegueira e pela surdez. Por um período, ainda que limitado, o Projeto MUSICAR permitiu idealizar uma situação em que estas comunidades não estão privadas da aprendizagem musical, seja por insuficiência da formação dos corpos docentes e não-docentes dos conservatórios, por ausência de uma organização administrativa ajustada, de recursos logísticos suficientes e adaptados, ou pela simples falta de sensibilização das sociedades para esta realidade, inclusivamente dos cegos, dos surdos e das próprias famílias.

As aulas com professores motivados, os ensaios com uma orquestra de músicos profissionais – entre os quais cegos, surdos, normovisuais e ouvintes –, para lá das condições oferecidas por um teatro de referência plenamente equipado, quis demonstrar que é possível atingir resultados extraordinários desde que estejam reunidas as condições necessárias e haja igualdade de oportunidades.

Mais genericamente, a iniciativa procurou ser um modesto contributo para o desenvolvimento da autonomia de todos os que têm vontade de aprender ou ensinar música, independente das suas condições, e assim habilitar todos para a plena fruição do mundo das artes. Para lá das redes sociais, a consciência social sobre esta realidade passa inevitavelmente por lugares de representação e encontro como salas de aula e palcos de teatros.