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A Eterna Amada

A relação entre a vida pessoal de Beethoven e a sua produção criativa não é evidente na Oitava Sinfonia. Foi naquele mesmo verão de 1812, quando a compôs, que com o coração destroçado escreveu as célebres três cartas de despedida à «eterna amada». Essa autocomiseração contrasta com o ânimo soalheiro e afirmativo da partitura. Curiosamente, já na ocasião em que redigira o lúgubre Testamento de Heiligenstadt, em 1802, outro documento fulcral para a compreensão da sua biografia, compusera a exuberante segunda sinfonia.

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Porque, na época, os centros urbanos se tornavam insalubres com o calor do verão, Beethoven costumava ausentar-se de Viena neste período do ano. No final de junho dirigiu-se a uma estância de saúde situada em Teplitz, na região da Boémia. Privaria aí com o poeta Johann Wolfgang von Goethe durante cerca de uma semana. Antes, pelo caminho, permaneceu alguns dias em Praga, onde terá encontrado o casal Brentano – Franz e Antonie –, de quem era amigo. Beethoven seguiu para Teplitz no dia 5 de julho e as cartas datam dos dias 6 e 7. Muitos historiadores defendem que o compositor estaria apaixonado por Antonie Brentano – um amor impossível, portanto. Outros indicam a cantora berlinense Amalie Sebald como a verdadeira destinatária, quem havia conhecido no ano anterior, também em Teplice, e que reencontrava nesta ocasião. Certo é que o desgosto amoroso se juntava a uma condição de saúde já de si bastante debilitada, com patologias intestinais, para lá das bem conhecidas mazelas auditivas. Foi então que escreveu no diário: «O algodão nas orelhas, quando estou ao piano, atenua o ruído penoso do meu ouvido enfermo».

Beethoven atravessava mais um momento crítico da sua vida. Enquanto isso, escrevia uma obra de temperamento otimista. Trabalhava na Oitava Sinfonia, a qual já havia esboçado no final do ano anterior, e só terminaria no mês de outubro, já em Linz, onde visitou o irmão Johann antes de regressar a Viena. Depois, entrou numa depressão profunda. Nos dois anos que se seguiram compôs apenas duas sonatas para violoncelo e pouco mais. A nona sinfonia teria que esperar doze anos.

 

Rui Campos Leitão