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A Sinfonia Escocesa

A Sinfonia N.º 3 de Mendelssohn é conhecida como Escocesa porque teve origem numa viagem de Mendelssohn àquele país, quando tinha apenas vinte anos de idade. Não se espere porém reconhecer o som das gaitas de foles ou da música tradicional das Highlands. Na vez de melodias rústicas, como acontece na Sinfonia Italiana, tudo se desenrola num registo épico que procura ressaltar a importância histórica de um lugar.

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Entre as três sinfonias de maturidade de Mendelssohn, a Sinfonia Escocesa foi a única publicada durante a sua vida. Chamamos-lhe aqui uma sinfonia de maturidade porque, apesar de ter sido iniciada em 1829, só foi completada em janeiro de 1842, já na cidade de Berlim, e estreada no mês de março seguinte, em Leipzig. Por sinal, só o Andante inicial foi efetivamente esboçado na Escócia.

Tudo começou, portanto, naquele ano de 1829, quando no mês de abril o músico partiu de Berlim rumo a Inglaterra, iniciando um período de viagens suportadas financeiramente pela própria família e que se estendeu durante cerca de três anos. Já em agosto, enquanto frequentava os salões mais ilustres da cidade de Londres, planeou com o seu amigo Karl Klingemann uma expedição a pé por terras da Escócia. A ideia era caminhar desde Edimburgo até à costa oeste, e depois atravessar de barco para a Ilha de Mull. Esta aventura veio a inspirar a célebre abertura orquestral As Hébridas. Mas foi ainda em Edimburgo que Mendelssohn se deixou impressionar pelas gaitas de foles e pela visita ao Palácio de Holyrood, onde reinou Maria Stuart, no século XVI. Foi diante daquelas ruínas que nasceu a ideia de compor uma sinfonia. Ao ouvi-la, admite-se que esse capítulo da história escocesa possa ter inspirado a criação.

O melodia que se estende sem pressa na secção introdutória serve de referência para o estado de ânimo que predomina ao longo de quatro andamentos que, conforme determinação do próprio compositor, deverão ser interpretados sem interrupções. Tudo se constrói na tensão instalada entre sonoridades pastoris e alusões marciais, como numa narrativa indecifrável que parece dialogar com a história do monumento. Progressivamente, somos conduzidos por cadências quase dançáveis. E se tivéssemos de associar uma pintura ao final deste primeiro andamento, sugeriríamos uma imensa tempestade. 

Depois disso, já no andamento seguinte, tudo se apresenta mais desanuviado, muito embora frenético, nalguns instantes. Os motivos melódicos saltitam de instrumento em instrumento, permitindo imaginar um retrato de paisagens campestres escocesas no esplendor da primavera. Este é o único momento da sinfonia que permite conjeturar uma referência explícita à música tradicional da Escócia. É uma ambiente bucólico que contrasta com o rigor da marcha lenta que preenche o terceiro andamento.

O andamento final é o mais complexo, e também aquele que consegue obter um efeito dramático mais impactante. Nele se confrontam os motivos soltos com a impetuosidade rítmica de um cenário bélico, desta vez mais contundente e sublinhada por uma orquestração carregada de tímpanos e metais. Tudo parece terminar em vitória, ao som de um hino que se repete várias vezes, com pompa e circunstância.

 

Rui Campos Leitão

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