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OML leva fantasia de flauta à Biblioteca Nacional, em Lisboa

O solista Nuno Inácio e a Orquestra Metropolitana de Lisboa apresentam dia 3 de julho “Música na Biblioteca I”, um programa que reúne Jogos de Pássaros, uma obra de Sérgio Azevedo, e a Sinfonia N.º 36 de Mozart, na Biblioteca Nacional de Portugal, no Campo Grande.

Nuno Inácio

Jogos de Pássaros, “Giochi di Uccelli” no original, é um concerto para Flauta e Orquestra escrito diretamente para Nuno Inácio por Sérgio Azevedo e estreado originalmente pela Metropolitana em 2017.

O flautista da OML voltou agora a mergulhar na obra “de uma outra forma, com outro tempo e noutro contexto”, como explicou ao nosso site.

“O confinamento a que todos fomos obrigados permitiu-me ter mais silêncio, mais paz, e capacidade de reflexão. Foi possível, por isso, preparar esta obra, que é muito exigente, de uma forma mais profunda”, afirmou.

Nuno Inácio, 43 anos, sublinha que Giochi di Uccelli “é um concerto muito exigente do ponto de vista técnico”. “O Sérgio utilizou a flauta de uma forma muito ousada do ponto de vista técnico, que exige um enorme virtuosismo no domínio do instrumento”, acrescentou.

Para o músico, que é 1.º flautista da OML desde 2005, “mergulhar de novo nesta obra é uma enorme alegria, porque permite sempre uma nova leitura, novas abordagens interpretativas”. “Há sempre coisas que se descobrem como se fosse a primeira vez”, assegurou.

Nuno Inácio aproveitou ainda para lançar um convite ao público para que se dirija à Biblioteca Nacional na próxima sexta-feira, dia 3, às 21h30. “Este é um tempo que nos esforçamos todos por regressar à normalidade, depois de uma época confusa e de isolamento. A sala é muito grande, tem um pé direito muito alto, estão asseguradas todas as normas de segurança e de distanciamento. Além disso, o público vai ter oportunidade de assistir a duas obras esteticamente muito diferenciadas. Este trabalho, esta dedicação à música e à arte e este profissionalismo só fazem sentido com e para o público. Por isso, esperamos por todos”, concluiu.

Recorde agora o texto de apresentação da obra «Giochi di Uccelli» assinado pelo compositor Sérgio Azevedo em 2017:

«Giochi di Uccelli» – Concerto para Flauta e Orquestra foi escrito em 2016. Intitulado, em italiano, «Jogos de Pássaros», os andamentos oferecem uma alternância rápido-lento e os dois andamentos lentos são estruturados de forma obsessiva: «Ciaccona Notturna» e «Passacaglia – mesto». Estas formas permitem uma grande concentração expressiva, uma vez que o material de base é constantemente reiterado no discurso, como que se de uma grande árvore se tratasse (o tema de base), uma árvore que é rodeada por pássaros que esvoaçam à sua volta (as volúveis figurações que rodeiam o tema). Esta descrição traz-me naturalmente a referir o porquê do título e as implicações que o mesmo tem na música. A ideia da flauta como tradutora, pela agilidade e sonoridade aguda, dos pássaros, é antiga, mas nesta obra, não quis imitar deliberadamente o canto dos pássaros (excepto na cadência da orquestra no início do 5.º andamento). Quis antes criar algumas metáforas musicais, como a da árvore antes referida. O movimento de conjunto de bandos de pássaros e da sua «dança» aérea coordenada também me deu algumas ideias, mas, repito, todas elas se traduziram quase sempre em estruturas musicais abstractas e não em imitações deliberadas desses fenómenos.

A cadência orquestral, com que se inicia o 5.º andamento é, por isso, um momento excepcional. Aí, cada instrumento de sopro das madeiras, e algumas cordas solistas, se transformam em diferentes pássaros, criando uma textura quase improvisada que precede a cadência para a flauta solo. O sermão de São Francisco aos pássaros veio-me imediatamente à memória, ao criar essa secção. Também o cântico dos pássaros, reagindo ao início do dia numa grande árvore à frente da minha casa contribuiu para essa atmosfera quase mística, e pela mesma razão cito no início dessa secção os pássaros do início de «Lever du Jour», do bailado «Daphnis et Chloé» de Ravel.

Dedico esta obra ao Nuno Inácio e também à memória de Carlos de Pontes Leça, cuja morte nos surpreendeu a todos estava o concerto ainda numa fase inicial. Foi, aliás, depois de saber essa triste notícia, que resolvi alterar o plano inicial da obra e escrever uma secção dedicada a São Francisco, certo de que o Carlos a teria apreciado. Lamento que já não a vá poder ouvir, pelo menos nesta terra.

Sérgio Azevedo