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Na segunda metade do século XVIII, os compositores italianos afirmavam-se quase sempre no mundo ópera. Luigi Boccherini foi exceção. Contemporâneo de Haydn e Mozart, tinha evidentes afinidades com os clássicos vienenses. Porém, para lá da coerência temática e do rigor formal, as suas obras instrumentais apresentavam melodias cantabili e uma desenvoltura expressiva notáveis. O Concerto para Violoncelo em Si Bemol Maior é bom exemplo deste classicismo de sangue quente.
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Luigi Boccherini nasceu em 1743, na cidade de Lucca, na região da Toscana. No início da carreira, construiu a reputação enquanto violoncelista virtuoso, tal como o fizeram Mozart e Beethoven ao piano. Terá sido nesse primeiro período, antes de se fixar em Madrid, com cerca de 26 anos, que compôs uma dúzia de concertos para violoncelo que tocava, entre outras cidades, em Paris e Viena. Os mais críticos defendem que são estilisticamente antiquados para a época, ainda muito semelhante à música barroca. Com efeito, abundam ornamentações. Os encadeamentos harmónicos são previsíveis. As orquestrações são pouco sofisticadas, baseadas na sustentação rítmica dos graves. E as linhas melódicas são quase inteiramente confiadas ao solista ou ao naipe dos primeiros violinos. Mas há um refinamento e uma graciosidade que se distingue imediatamente da solidez dos clássicos austríacos.
Neste Concerto em Si Bemol Maior, composto por volta 1770, destaca-se, portanto, a combinação do virtuosismo com um estilo cantabile afim à ópera italiana. Mas é evidente a demarcação dos concertos barrocos de Vivaldi. Curiosamente, tornou-se no concerto mais conhecido de Boccherini desde que, em 1895, o violoncelista alemão Friedrich Grüzmacher publicou uma transcrição bastante livre, ao gosto romântico, para violoncelo e piano, e cinco anos mais tarde uma versão para orquestra. A versão original tem os mesmos três andamentos, mas a instrumentação conta somente com as cordas e duas trompas.
Rui Campos Leitão