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Luigi Boccherini passou a maior parte da vida em Espanha. Inicialmente como instrumentista, foi nomeado logo em 1770 Compositor da Capela Real de Luis Antonio, irmão do Rei Carlos III. Serviu em regime de exclusividade o infante até 1785. Só então passou a compor também para Frederico Guilherme II, o sucessor de Frederico O Grande. Apesar de nunca ter trocado Madrid por Berlim, muita música de câmara e várias sinfonias foram dedicadas a este monarca, tais como a Sinfonia G. 519, em 1788.
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Foi em Espanha que Boccherini construiu a sua reputação de compositor, sobretudo no domínio da música de câmara. O catálogo conta centenas de obras de música de câmara, muitas delas trios, quartetos e quintetos de cordas. Mas também trinta sinfonias e uma dúzia de concertos para violoncelo. Frederico Guilherme II ouviu pela primeira vez a sua música em 1783, numa ocasião em que o embaixador de Frederico O Grande em Madrid lhe enviou as partituras dos quintetos Op. 33. O então (ainda) sucessor do trono da Prússia tocava violoncelo e logo escreveu uma carta ao compositor manifestando o interesse de o patrocinar, tal como veio a fazer com Mozart, Haydn e Beethoven. Porém, só depois de o infante Don Luis ter morrido, em 1785, foi possível aceitar o convite. Assinou então um contrato que perdurou até 1897 e que o comprometia a compor doze obras todos os anos, em particular música de câmara, quartetos e quintetos de cordas, mas também sinfonias.
Foram escritas várias sinfonias para a corte de Berlim, tais como o caderno com as quatro sinfonias G. 514-518 (anterior) e mais duas sinfonias nos dois anos seguintes. A partitura da Sinfonia G. 519 indica a tonalidade de Dó Menor, a qual favorece a solenidade e sentimentos melancólicos. Explora o tratamento cíclico de ideias melódicas discretamente apresentadas de início, recuperando-as e transformando-as ao longo dos restantes andamentos. É curioso também notar cuidados nas combinações instrumentais próprios da música de câmara. Na Pastorale (o segundo andamento), que se estrutura em Forma Rondó, alterando o Tutti com três episódios solísticos, o oboé e o violino destacam-se de maneira quase concertante. A secção central do Minueto é tocada somente pelos sopros da orquestra. Por fim, a energia irradiante do último andamento é emprestada do ritmo de uma Tarantella. Equilibra-se entre a precipitação dramática da ópera e um ambiente social festivo.
Rui Campos Leitão