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A Galinha

Não é necessário esperar muito tempo para que se desvende a razão do cognome da Sinfonia N.º 83 de Haydn – A Galinha. Após uma primeira secção carregada de dramatismo e solenidade, com a duração aproximada de um minuto e meio, logo surge uma melodia nervosa apresentada pelos violinos e sublinhada por notas curtas obstinadamente repetidas pelo oboé.

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Não foi Joseph Haydn quem atribuiu o nome a esta sinfonia, mas é fácil associar alguns dos seus motivos ao comportamento daquele animal. Gestos repentinos, relutantes e aparentemente supérfluos – são estas algumas das características que também poderíamos atribuir ao segundo tema do primeiro andamento. Ficam assim patentes os contrastes expressivos que Haydn deliberadamente fez despontar ao longo de toda a obra. Por outras palavras, poderia dizer-se «Sturm und Drang» – ou, traduzindo para a língua portuguesa, «Tempestade e Ímpeto». Designa-se assim o influente movimento literário alemão que na segunda metade do século XVIII postulava a espontaneidade emotiva em detrimento dos excessos formalistas determinados pela razão. Na música, coube a compositores como Haydn e Mozart darem corpo a essas orientações estéticas. Os contornos melódicos apresentam-se imprevisíveis, as tonalidades menores tornam-se mais presentes, as variações bruscas e as dinâmicas enfatizam a carga dramática. Em suma, assiste-se a tudo aquilo que se conhecia da ópera, mas transposto para a música instrumental. É esta a «chave» para entrar no universo desta sinfonia que o compositor escreveu por encomenda de um aristocrata francês, em conjunto com  as cinco Sinfonias de Paris.

No segundo andamento instala-se um clima idílico. Porém, também aí há lugar a efeitos inesperados, intensos, desde logo protagonizados por gestos abruptos nas cordas. No terceiro, a frivolidade dos salões parisienses é recriada através de um Minueto, mas aqui e ali atravessada por golpes rústicos mais conformes à tradição austríaca. Por último, um Finale em que ritmos de dança plenos de jovialidade são recorrentemente interrompidos por sequências harmónicas carregadas de dramatismo.

 

Rui Campos Leitão