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Os Quadros de Hartmann

Infelizmente, grande parte das centenas de telas de Viktor Hartmann (1834-1873) não chegaram aos nossos dias, entre as quais algumas daquelas em que Mussorgsky se baseou para compor Quadros de uma Exposição. Em rigor, só nos é hoje possível identificar seis telas de Hartmann relacionadas com as peças da suíte, havendo outras hipóteses não confirmadas. É possível que Mussorgsky também se tenha inspirado em desenhos e aguarelas que teve a oportunidade de contemplar na casa do pintor.

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I. O gnomo

O primeiro quadro representava um brinquedo com forma de gnomo, uma personagem que aparece nas lendas e na mitologia europeia. É sempre de pequena estatura e aparece muitas vezes associada a poderes mágicos protetores da natureza e dos segredos da humanidade. Quem leu a trilogia de livros O Senhor dos anéis, ou viu os filmes, sabe bem do que se trata. Esta música traduz magnificamente esse clima de fantasia e mistério.

II. O velho castelo

Aqui aparecia um trovador inspirado pela sua tristeza cantando e tocando alaúde junto de um castelo muito antigo. A música vai precisamente ao encontro dessa melancolia e da beleza nostálgica que se encontraria no quadro.

III. O jardim das Tulherias

A ilustração musical da gritaria enérgica das crianças brincando num parque.

IV. Bydlo

A tradução deste nome tem suscitado várias dúvidas sobre a intenção do compositor. Pode tratar-se do arrastar pesado de um carro de bois. Ou buscar a conotação fúnebre de uma execução pública. Ou, ainda, as condições de vida miseráveis de um povo, já que a palavra «Bydlo» também pode ser traduzida por «ralé».

V. Bailado dos pintainhos a sair dos ovos

Um bailado de pintainhos ainda dentro das suas cascas. Este era um dos esboços que Hartmann havia feito para os figurinos das personagens de um bailado infantil coreografado por Marius Petipa. A música representa a descoordenação e a ingenuidade dessas figuras.

VI. A discussão entre um judeu rico e outro pobre

Na realidade trata-se de dois quadros. Um representa um judeu arrogante e presunçoso, o outro um judeu pobre e desgostoso. De início, os temas musicais que correspondem a cada uma das figuras alternam-se, misturando-se à medida em que se avança na «conversa» imaginada por Mussorgsky.

VII. O mercado de Limoges

Aqui evoca-se o barulho das conversas entre mulheres vendedoras e tagarelas de um mercado da cidade francesa de Limoges, uma situação representada num quadro que também nunca nos chegou.

VIII. As catacumbas (sepulcro romano) – Cum mortuis in lingua mortua

Bem contrastante é a ambiência sugestionada por este quadro, onde se destaca uma misteriosa escuridão e se consegue imaginar os ecos que se ouviriam nas galerias subterrâneas da cidade de Paris. O quadro representaria o próprio Hartmann na companhia de um seu amigo arquiteto.

IX. A cabana da feiticeira Baba Yaga

Baba Yaga é uma figura mitológica que aparece recorrentemente nos contos tradicionais russos da segunda metade do século XIX. Trata-se de uma feiticeira muito velha que viajava pelos céus. Nesta imagem não aparecem representadas, mas muitos garantem que a cabana tinha patas de galinha e a fechadura era uma boca cheia de dentes bicudos. Sinistro!

X. O grande pórtico de Kiev

A terminar, o desenho de um grande portal que Hartmann esboçou para o concurso da construção de um monumento que celebraria a sobrevivência do Czar russo a um atentado, em 1866. O projeto nunca chegou a concretizar-se. Hartmann imaginou um pórtico em forma de elmo… imponente, grandioso, como o final desta obra.

 

Rui Campos Leitão