O compositor Gabriel Pierné (1863-1937) foi contemporâneo de figuras como Claude Debussy, Albert Roussel e Maurice Ravel. A sua música reconhece-se num estilo caracteristicamente francês, que dá preferência às sugestões extramusicais, em detrimento do aparato sinfónico. A suíte para piano Ballet de Cour é disso exemplo. São seis peças evocativas de danças de corte setecentistas. Composta em 1901, e prontamente orquestrada pelo próprio, tem no quarto número um dos seus momentos mais conhecidos. Aí contrasta a melodia pesarosa de uma Pavana e a exuberância rítmica de um Saltarello.
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O panorama musical francês do século XIX foi muito rico, repleto de diversidade e tensões que pareciam acompanhar de perto os sobressaltos políticos e sociais da época. As causas da Revolução de 1789 ecoaram no período da Restauração, conduzindo à insurreição de 1830, e em 1848 inspiraram a instauração da Segunda República. Já em 1870, o desaire da Guerra Franco-Prussiana despertou sentimentos nacionalistas e abriu caminho ao espírito da modernidade. Ao longo das décadas coexistiram várias tendências, tais como a ópera italiana e a opéra-comique, sociedades de concerto que cultivavam a música germânica, outras que adulavam os instrumentistas virtuosos, outras ainda com vocação progressista, como a Société Nationale de Musique, fundada em 1871. Havia também o célebre Prix de Rome, para lá de instituições de ensino como a Schola Cantorum, focada na música religiosa do passado, e o Conservatório de Paris, onde a primazia do teatro lírico não impedia que jovens compositores se dedicassem à música instrumental. Foi nesta escola que Gabriel Pierné estudou composição e órgão, com Jules Massenet e César Franck, respetivamente.
Curiosamente, nas últimas décadas do século o órgão teve um momento áureo em França, por intermédio de compositores como Saint- Saëns e César Franck, entre outros. Por essa via, assistiu-se a um revivalismo da música barroca, em particular da figura de Bach. A geração seguinte optou, no entanto, por compor para piano. Foram os casos de Claude Debussy, Dukas, Roussel e o próprio Pierné, apesar de este ser organista. Ainda assim, não abandonaram a apropriação da música do passado, designadamente do século XVIII. Ballet de Cour, de Pierné, evoca explicitamente esse gosto pitoresco pelo «estilo antigo» (I. Rigaudon, II. Passepied, III. La Canarie, IV. Pavane et Saltarello, V. Menuet du Roy e VI. Passa-Mezzo).