Quem não conhece o motivo de quatro notas que dá início à Quinta Sinfonia de Beethoven? É, pois, chegada a hora de ver «o que vem de seguida». Ao longo de quatro andamentos assiste-se a uma obsessiva persistência em torno desse tema germinal, derivando noutros temas melódicos que nunca se afastam definitivamente. Explica-se assim a força desta obra.
**
Estreada em dezembro de 1808, a célebre Quinta Sinfonia desenrola-se em quatro andamentos. Em cada um deles, as ideias musicais sucedem-se, emanando múltiplas sugestões em função do que se passou antes e daquilo que vem de seguida. Por vezes, é a memória do que se ouviu minutos atrás que empresta oportunidade a momentos aparentemente inusitados. Noutras, nada aconteceu antes que permita algum relacionamento. Cria-se assim expectativa, desde logo com as quatro notas que dão início a esta sinfonia, o mais famoso motivo melódico de toda a História da Música.
Anuncia-se deste modo uma persistência obsessiva em torno de uma ideia aparentemente simples. Em vez de se repetir, vai derivando nos mais variados temas melódicos, que todavia nunca se afastam definitivamente da origem. No segundo andamento surgem duas melodias de caráter lírico, sempre lembrando «a tal» ideia rítmica; primeiro com as violas e os violoncelos, depois com as trompas e as trompetes. Seguem-se algumas variações, aqui e ali evocando o tom majestoso que se ouviu no primeiro andamento. O terceiro andamento é um bem humorado Scherzo. Lembra o tema inicial, primeiro nas trompas, depois nas mais variadas combinações de instrumentos, mas sempre de forma obstinada. Com uma fuga pelo meio, é desta forma que se acumula a intensidade dramática que garante o efeito do último andamento. Após alguns momentos de impasse, chega assim, sem interrupção, a proclamação gloriosa, o momento triunfante. Ostenta-se cadências e acordes que não teriam sentido se não nos lembrássemos do primeiro tema do segundo andamento e, sobretudo, do tal motivo original, esse mesmo que se escreve com quatro notas só.
Rui Campos Leitão