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A Quinta Sinfonia de Schubert

No contexto da produção sinfónica de Franz Schubert, e em comparação com a Sinfonia N.º 4 (a «Trágica»), a N.º 5 poderá parecer um passo dado atrás – num entendimento evolucionista da História da Arte é contranatura investir em formatos instituídos pelo passado quando já se vislumbram tendências futuras. Mas a questão não se colocava para o jovem Schubert em 1816, em particular diante do fascínio que sentia pela música de Mozart. Composta aos dezanove anos de idade, a Quinta Sinfonia revela simultaneamente a disciplina e a irreverência de um talento singular.

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    No dia 13 de junho de 1816, Franz Schubert escreveu assim no diário: «Recordarei este dia para o resto da minha vida como um dia brilhante, cristalino e adorável. Delicadamente, como se estivesse ao longe, a magia da música de Mozart soou nos meus ouvidos. Foi tal o equilíbrio entre força e suavidade, tal o poder magistral com que Schlesinger tocou, que a música me impressionou profundamente, no fundo do coração! Deste modo, essas doces impressões, trespassando as nossas almas, atuam benevolamente no mais íntimo do nosso ser, o que em momento algum, sejam quais forem as circunstâncias, poderá ser contrariado. Na escuridão desta vida, elas mostram-nos uma nítida e terna distância onde recolhemos confiança e esperança. Mozart! Mozart imortal! Quantas e quantas imagens de um mundo melhor e mais radioso gravaste nas nossas almas!»

Este testemunho refere-se, em particular, a um quinteto de cordas do compositor de Salzburgo, mas depreende-se das suas palavras que a admiração de Schubert tinha um alcance bastante mais amplo. O episódio a que se refere separa a Sinfonia N.º 4, completada no mês de abril anterior, da Sinfonia N.º 5, escrita em setembro e outubro. Adivinha-se, portanto, a razão que explica a diferença de registos entre as duas obras. De forma salutar, o jovem Schubert procurava apropriar-se dos modelos consolidados pelos mestres. Assim, se à primeira é possível associar a animosidade de Beethoven, a influência de Mozart torna-se evidente na segunda. Para o comprovar, basta comparar o tema melódico do terceiro andamento da Sinfonia N.º 40 de Mozart com o início do 3.º andamento da N.º 5 de Schubert.

Rui Campos Leitão