Quando se fala da relação de Mendelssohn com a chamada «música antiga», é comum lembrar o seu contributo para o revivalismo da música de J. S. Bach, e em particular o episódio da «estreia moderna» da Paixão Segundo São Mateus que em 1829 se ouviu parcialmente tocada em Berlim. É bom lembrar, todavia, a importância que, nesse contexto, teve o seu professor Carl Friedrich Zelter, quem durante sete anos o formou com base na tradição musical do século anterior. As sinfonias para cordas do jovem Mendelssohn ecoam influências desse passado.
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Discípulo das lições de piano de Ludwig Berger (1777-1839), aos nove anos de idade Mendelssohn tocava em público. Pouco tempo depois, em 1819, iniciou a aprendizagem da composição musical com Carl Friedrich Zelter (1758–1832). Zelter tinha estudado com os compositores berlinenses contemporâneos de C. P. E. Bach, J. Kirnberger e C. F. C. Fasch (1736–1800), e foi fundador da Academia de Canto de Berlim, onde se interpretava a música J. S. Bach. Para lá de compositor, Zelter era um eminente pedagogo. Valorizava tanto as metodologias de ensino daquele passado que as instituiu em várias escolas de música que instaurou com o patrocínio régio. Estava, portanto, conotado como a «escola antiga», numa altura em que a consciência histórica não era cultivada como nos nossos dias.
Compreende-se assim o respeito que Mendelssohn tinha pela música de compositores antepassados, em particular de Händel, J. S. Bach, Haydn, Mozart, Hummel e C. P. E. Bach, cujas partituras Zeller encorajou a estudar. Começou por fazer exercícios de baixo contínuo, depois a escrever corais a quatro vozes, contraponto e fugas. Teve, portanto, uma formação extremamente sólida, o que trespassa nas suas primeiras sinfonias para cordas, as quais a própria mãe descreveu numa carta como sendo compostas «à maneira dos compositores antigos». Com efeito, a atmosfera que rodeava Mendelssohn nesses primeiros anos era bastante conservadora. O estilo heróico de Beethoven ou o romantismo exacerbado de Carl Maria von Weber não faziam parte dos modelos que se propunha seguir.
As doze sinfonias para cordas foram compostas num período de tempo aproximado a dois anos. As primeiras sete em 1821. A oitava em novembro do ano seguinte. As restantes entre março e setembro de 1823. Muito além de estudos académicos, demonstram uma vontade imensa de dominar os processos de escrita para cordas. Por demais as primeiras cinco, que revelam uma enorme preocupação em respeitar o formalismo clássico, mas sem nunca comprometer a procura de um estilo pessoal. No conjunto, surpreendem pela diversidade estilística. Os contrastes dinâmicos, e a ênfase da afetação expressiva denota uma semelhança interessante com as sinfonias de C. P. E. Bach. Desde logo, na primeira de todas elas. Muito embora se aproprie de técnicas emprestadas de Haydn e de Mozart, permite reconhecer inúmeras características desse estilo (ainda) barroco, com uma orquestração que explora o confronto entre os diferentes naipes, contrastes dinâmicos acentuados e passagens contrapontísticas de elaboração complexa. Sobre uma linha de baixo preponderante e omnipresente, está repleta de mudanças abruptas nas figurações rítmicas e na gestão das intensidades. De modo característico, destaca-se igualmente a comoção melódica do andamento lento.
Esta apropriação do estilo de C. P. E. Bach estende-se também à Sinfonia N.º 6, desde logo nos uníssonos iniciais. Escrita no outono de 1821, é sobretudo nesta obra que se começa a vislumbrar uma identidade criativa singular, sobretudo no último andamento. Ainda assim, também aqui é notória nalguns momentos a influência do estilo fugado do pai Bach. Mas a diversidade estilística impera, também pelas texturas cristalinas que lembram a música de Mozart. Pelo meio, no segundo andamento, deparamo-nos com o contributo da sobriedade de Haydn, no Minueto, em alternância com a textura coral que sobressai nos Trios.