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A Abertura Coriolano

A Abertura Coriolano é uma peça orquestral com cerca de oito minutos, o que contrasta com a dimensão colossal das sinfonias que Beethoven compôs naqueles anos. Foi estreada em Viena num concerto por subscrição, em março de 1807. De uma assentada, abria caminho a dois formatos que perduraram no panorama musical oitocentista: a abertura de concerto e o poema sinfónico.

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Na primeira de todas as fontes, as Vidas paralelas de Plutarco, lê-se que Caius Marcius, um patrício romano de grande coragem e força física passou a chamar-se Coriolanus após a vitória contra os volscos no século V A.C., na antiga cidade de Corioli. Renegado depois pelo seu povo, juntou-se com espírito de vingança ao inimigo para lutar pela conquista de Roma. Fraquejou, porém, diante da eminente devastação da cidade onde ainda vivia sua mãe. Depois de a escutar, «levantou-a, apertou fortemente a sua mão direita e disse: “Ganhaste! Esta é uma vitória afortunada para a pátria, mas fatal para mim, pois só por ti me vou daqui, derrotado.”» Salvando Roma, aquela mãe sentenciou o filho à morte. 

No início do século XVII, William Shakespeare recuperou a história numa sua tragédia e, passados mais dois séculos, uma peça teatral de Heinrich Joseph von Collin inspirada no mesmo enredo era representada com grande frequência nos teatros da cidade de Viena. Foi nessa altura que Beethoven compôs a sua Abertura Coriolano, muito embora nunca a tenha pensado como música cénica. Trata-se aqui, portanto, de uma peça exclusivamente instrumental, mas que está associada a uma narrativa. Por isso, é praticamente invevitável nela buscar uma ilustração (ainda que vaga) daquela sequência de eventos, assim como a energia e as emoções das personagens. Os acordes iniciais espelham bem a dimensão trágica da figura do herói. Mas permanecerão sempre dúvidas sobre o que Beethoven nos quis «dizer». A personalidade do músico caracterizava-se pela irreverência, pelo voluntarismo abnegado, pela determinação artística e por uma assumida paixão decorrente de compromissos ideológicos. Terão sido estas qualidades que o músico alemão reconheceu na figura do general romano. Poderá ter-se identificado com o drama de um líder exilado que se insurgiu contra o seu povo e terminou por morrer nas teias de um dilema, na busca de uma reconciliação.

 

Rui Campos Leitão

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